RN teve 117 mortes por AVC registradas até maio de 2024

05/08/2024

RN teve 117 mortes por AVC registradas até maio de 2024

05/08/2024

RN teve 117 mortes por AVC registradas até maio de 2024

Em 2014, aos 26 anos, Rayane Macedo identificou a presença de trombos nas pernas provocados, segundo ela, pelo uso de anticoncepcionais. Sem saber a causa dos coágulos, a dona de casa seguiu fazendo uso dos medicamentos, até que, no ano seguinte, ela teve um Acidente Vascular Cerebral (AVC) isquêmico, provocado pelos trombos. Há cerca de duas semanas, Rayane, que mora em Mossoró, passou por um segundo episódio da doença que a deixou com o lado direito do corpo sem movimentos. De acordo com a Sesap, o AVC foi responsável por 814 internações no Estado entre janeiro e maio deste ano e 117 mortes no período.

O número de pessoas internadas neste ano em decorrência de Acidente Vascular Cerebral corresponde a um terço do total de internações em 2023, quando 2.555 pacientes foram hospitalizadas. A quantidade equivale a uma redução de 15,3% no comparativo com 2022, quando a Secretaria de Saúde do Estado registrou 3.017 internações pela doença. O neurologista Marcelo Marinho explica que sinais como fraqueza, boca torta, fala enrolada, perda de coordenação, sensibilidade e visão, são indícios de que uma pessoa está em um episódio de AVC.


“A gente chama esses sintomas de déficit neurológico focal. Eles são provocados por danos no cérebro, os quais ocorrem de acordo com o subtipo de derrame. No isquêmico, que responde por 80% dos casos, uma artéria entope, o que ocasiona falta de sangue dali para frente. Já no hemorrágico (20% dos casos), a artéria se rompe e provoca um sangramento dentro do cérebro”, explica Marinho.


Rayane Macedo conta que, nos dois episódios, foi acometida por AVC isquêmico. Da última vez, há duas semanas, ela relatou que assistia televisão quando sentiu o lado direito do corpo dormente. “Falei para o meu esposo o que estava sentindo e, depois disso, não me lembro de quase nada, porque perdi um pouco a consciência”, narra. A dona de casa foi internada no Hospital Tarcísio Maia, onde permaneceu alguns dias na semi-UTI. “Comecei a ser medicada, mas fiquei sem movimento no lado do corpo afetado. A fisioterapia tem me ajudado bastante, já consigo andar lentamente, mas ainda não recuperei os movimentos totalmente”, conta Rayane.


Marcelo Marinho, que é presidente da Sociedade Norteriograndense de Neurologia, explica que a prevenção da doença se faz com o combate aos fatores de risco – pressão alta, diabetes, colesterol, sedentarismo, obesidade, álcool, fumo e apneia do sono, estão entre os principais. Os cuidados são ainda mais importantes porque, de acordo com o médico, é muito difícil prever um episódio.


“O subtipo isquêmico às vezes dá um aviso [de que vai ocorrer]. Nós chamamos de ataque isquêmico transitório. Acontece quando a artéria entope e desentope rapidamente e os sintomas são logo revertidos. Mas, em geral, não dá para prever se a pessoa vai ou não ter um Acidente Vascular Cerebral. Os sinais só aparecem quando a pessoa já está sendo afetada”, diz.

Urgência no tratamento é primordial

Tratar rapidamente o Acidente Vascular Cerebral é essencial para evitar a morte e o agravamento dos casos. Segundo a Sesap, os óbitos por AVC tiveram redução de 11,6% em 2023 se comparado ao ano anterior: foram 465 mortes em 2022 no Estado e 411 no ano passado. Em 2024, até maio, são contabilizados 117 óbitos.
“Para tratar o AVC é preciso desentupir a artéria. Isso é feito de duas maneiras. A primeira é feita com injeção, na veia, de um trombolítico (medicamento). Ele vai até o cérebro para dissolver o coágulo que se formou. O problema é que há um período de quatro horas e meia para administrar esse remédio. Então, identificar o episódio, procurar uma assistência, fazer os exames e iniciar o tratamento se torna uma verdadeira corrida contra o tempo”, esclarece o neurologista Marcelo Marinho.


Outro tratamento é feito com cateterismo para desentupir a artéria, procedimento que pode ser executado com um pouco mais de tempo – até oito horas, em média. “O grande gargalo é que isso requer um especialista muito específico. Na rede privada até se consegue, mesmo com dificuldades, mas no SUS do RN ainda não temos esse especialista disponível”, pontua o médico. Rayane Macedo foi submetida ao tratamento com trombolítico. Ela diz que, após o primeiro AVC, começou a fazer acompanhamento médico e procurou combater os fatores de risco, mas perdas familiares do ano passado para cá fizeram com que ela deixasse os cuidados de lado.


“Perdi minhas duas avós e meu avô em um período de ano. Fiquei muito abalada e fui deixando os cuidados que tinha com alimentação e exercícios físicos para lá. Acredito que isso contribuiu para esse novo AVC”, especula. O neurologista Marcelo Marinho explica que os casos de AVC são mais comuns a partir dos 50 anos, embora pessoas de qualquer idade possam ser acometidas. “Quanto mais fatores de risco, mais chances de ter uma Acidente Vascular Cerebral. E é por isso que adultos e idosos são mais suscetíveis, porque estão expostos a esses fatores há mais tempo”, diz.


Ele diz que durante a pandemia, a incidência de AVC aumentou em todo mundo e em todas as faixas etárias, em razão da infecção por covid-19. No entanto, segundo o médico, atualmente não há nada que indique para uma ampliação de casos entre a população mais jovem. “A maior incidência na pandemia se deu porque a covid-19 causou AVC, uma vez que a doença provoca maior coagulação sanguínea. Mas, fora isso, para um jovem ser afetado depende mais de alguma condição, como um problema cardíaco de nascença, por exemplo, do que pelos fatores de risco”, pontua.

Assistência no SUS é precária, denuncia Sinmed

O presidente do Sindicato dos Médicos do RN (Sinmed), Geraldo Ferreira, critica a estrutura para assistência aos pacientes acometidos por AVC na rede SUS do Estado. O Hospital Monsenhor Walfredo Gurgel, em Natal, é referência neste tipo de atendimento. Para Ferreira, no entanto, o ideal seria uma nova unidade especializada para a assistência aos pacientes.


“O Walfredo é um hospital de emergência que se tornou unidade de internamento”, avalia. Ele também afirma que não há médicos suficientes nas escalas da unidade para atender à demanda que chega diariamente. “Muitos pediram demissão, outros se aposentaram, alguns foram deslocados para outro setor, de forma que a escala está absolutamente desfalcada”, descreve. Segundo Geraldo Ferreira, atualmente são cerca de três neurologistas na escala, quando o ideal seriam pelo menos 10.


Ele alerta que a alta demanda e o número insuficiente de médicos podem causar graves prejuízos aos pacientes. “Por dia, 12 pessoas dão entrada no Walfredo com suspeita de AVC. Destes, metade é diagnosticada e fica internada na unidade. Ou seja, é uma demanda alta. O ideal é que os primeiros procedimentos sejam realizados logo nas primeiras horas, mas há notícias de que, nesta semana, uma senhora levou quatro horas para ser atendida no hospital”, aponta. O presidente do Sinmed disse que pretende intermediar, junto à Sesap, a instalação de uma enfermaria no Hospital Universitário Onofre Lopes com assistência de primeira linha para esses pacientes.


“O Onofre tem residência médica de neurologista, com escalas completas, então seria o hospital ideal para montar uma assistência. A urgência poderia continuar a ser feita no Walfredo, mas não o tratamento sequenciado”, defende. Em nota, a Sesap afirmou que a rede estadual conta hoje com dois hospitais destacados para o tratamento de casos de AVC, com escala de neurologista 24 horas – o Walfredo Gurgel, em Natal, e o Tarcísio Maia, em Mossoró. “Recentemente, alguns neurologistas do quadro efetivo pediram afastamento ou diminuição de carga horária, o que vem sendo suprido por um contrato junto a uma cooperativa médica”, disse a pasta sem mencionar a quantidade de profissionais atuantes.


“Nesse momento, a Sesap trabalha para estruturar uma linha de cuidado do AVC ampliada, com a construção de uma unidade no Walfredo, com 10 leitos, e a incorporação dos hospitais regionais de Caicó e Pau dos Ferros, por possuírem tomógrafo, com atendimento por meio de telemedicina”. Sobre o Onofre Lopes, a pasta afirmou que “o hospital já funciona como retaguarda para casos neurológicos, não podendo ser incorporado neste momento por não dispor de escala 24h de neurologia”.

Fonte: Tribuna do Norte

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