Uma vela na escuridão

13/07/2014

Uma vela na escuridão

13/07/2014

 

A humanidade tem momentos de trevas, onde forças como religião, ideologia ou política perseguem, negam ou impedem o progresso da ciência. O Brasil vive um momento delicado dessa natureza na área de saúde, no qual opiniões, mentiras e fanatismo tentam substituir a ciência verdadeira. Por trás há interesse econômico, ocupação de mercado, confrontação de posições, implementação de ideologias. Tudo sob o manto do politicamente conveniente e oportunista, que é no que se transformou a ideologia do politicamente correto.
Temos como áreas críticas desse comportamento das autoridades a psiquiatria e a obstetrícia, com farta dose de desatino, prejudicando as atividades e levando a risco as pessoas que se beneficiam do progresso alcançado, fruto de pesquisas e estudo árduo.
A reação ao suposto poder do médico sobre condutas ou cuidados tem caminhado para os extremos. Há um dito popular que diz que de médico todo mundo tem um pouco, mas se há o sentimento de que cada um pode saber se cuidar, que é válido para cuidados primários, ninguém nega que a ciência, a técnica e a tecnologia entraram em cena para melhorar a vida das pessoas, não para piorar, como alardeiam os pregoeiros da desgraça. Ou alguém já viu pessoas dispensando profissionais que atuam nessas áreas como nutricionistas, psicólogos, educadores físicos, engenheiros, etc?
Mas com a infame campanha que o governo federal e outros têm alimentado contra os médicos, de repente tudo que a ciência construiu nessa área é questionado, não com trabalhos científicos ou estudos fundamentados, que possam ser expostos à crítica e comprovados. Não, a campanha é movida a base de opiniões pessoais, filosofias estranhas, ideologia, interesses políticos, interesses financeiros, e como sempre uma legião de bem intencionados e mal informados.
Qual a raiz dessa contestação? Porque na contramão da evolução científica, que diminuiu a mortalidade infantil e materna, a obstetrícia vem sofrendo um ataque descabido, não em defesa do parto natural, mas contrário às intervenções cirúrgicas, antissépticas e analgésicas que humanizaram o parto, antes uma torrente de gritos, lacerações, sequelas e muitas mortes? Que estranha decisão ampara esse comportamento?
E na Psiquiatria, porque o relativismo de que tudo é comportamento e não há doença? O resultado é o aumento do suicídio, da esquizofrenia e uma legião de abandonados nas ruas, matando e morrendo. E o que dizer das opiniões forçadas a respeito de supostos benefícios para a sociedade com a liberação de drogas, sem respaldo científico.
Analisando essa realidade, a Fenam teve há algumas semanas um encontro com uma desembargadora do Paraná, que lembrou que o parto natural, sem médicos e sem o amparo de profissionais, técnicas cirúrgicas e hospitais, tinha ceifado a vida de 11 filhos de sua avó, de um total de vinte que tivera.
Uma frase de Carl Sagan, o célebre astrônomo que popularizou muito a ciência, marca sua posição contra o charlatanismo fanático – a ciência é como uma vela acesa num quarto escuro.
O quarto escuro é o mundo, a ciência é a luz que ilumina sua compreensão e a nossa caminhada.

Geraldo Ferreira Filho – presidente Fenam e Sinmed RN

 

*Editorial publicado no Novo Jornal dia 13/07/2014.
 

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