Entidades médicas rejeitam proposta do Governo Federal para contratar médicos estrangeiros

06/05/2013

Entidades médicas rejeitam proposta do Governo Federal para contratar médicos estrangeiros

06/05/2013

 Todos os anos, centenas de novos médicos saem das universidades brasileiras e são inseridos no mercado de trabalho. No entanto, ainda assim, faltam profissionais no interior do país, nas periferias das grandes cidades e nos programas de assistência básica. Nem mesmo salários que podem chegar aos R$ 20 mil atraem o interesse de médicos. Diante da falta de médicos que assola a maioria dos municípios brasileiros, o Governo Federal pretende contratar médicos estrangeiros para amenizar o déficit de profissionais no interior do país e regiões de fronteiras.

A ministra das Relações Institucionais, Ideli Salvatti esteve em Natal nesta sexta-feira (3) participando da abertura do Encontro Estadual com Novos Prefeitos e Prefeitas do Rio Grande do Norte e confirmou o desejo da presidente Dilma Rousseff. De acordo com a ministra, o Governo Federal já prepara o projeto para encaminhá-lo ao Congresso Nacional. A decisão tem encontrado resistência entre a classe médica e as principais entidades da categoria que já se manifestaram de forma contrária à contratação de profissionais estrangeiros.

Segundo a ministra Ideli Salvatti, o Governo Federal tem conhecimento sobre os problemas que os municípios vêm enfrentando devido à falta de médicos dispostos a trabalhar no interior durante todos os dias da semana. Citando o discurso do prefeito de Lajes, Benes Leocádio, que relatou a negativa de um médico em realizar parto na cidade, Ideli Salvatti confirmou que o problema é comum no interior do Brasil. Por isso, a presidenta Dilma Rousseff já teria decidido realizar a contratação dos novos médicos.

“A presidenta vai trazer médicos do exterior porque não tem médicos em número suficiente para dar atendimento. Boa parte dos que têm não quer ir para o interior, e não vamos permitir que a população fique sem atendimento médico, que sejam penalizados”, disse Ideli Salvatti.

Entretanto, o presidente da Federação Nacional dos Médicos (Fenam) e também presidente do Sindicato dos Médicos do Rio Grande do Norte (Sinmed/RN), Geraldo Ferreira, afirma que o número atual de profissionais no Brasil, cerca de 1,9 médicos para cada mil pessoas, é capaz de atender o mercado nacional, na condição de que sejam criadas melhores estratégias de distribuição de profissionais e planos de carreira no setor público. Geraldo conta que a Fenam já entregou um manifesto contra a medida ao ministro da Saúde, Alexandre Padilha e a presidente Dilma Rousseff.

“A presidente está fazendo o planejamento estratégico de elevar o número para 2,4 médicos para mil habitantes. Realmente, para atingir isso hoje, faltam médicos. Mas se o planejamento é para atingir essa meta em 2020, nossa avaliação é diferente da do Governo, que trabalha com a ideia de que teríamos que importar médicos”, disse Geraldo Ferreira. “Com o lançamento de 17 mil médicos por ano no mercado, acreditamos que teríamos isso, sim. O que precisamos é melhorar a atratividade do setor público no Brasil para mantê-los lá. Injetar profissionais não vai necessariamente resolver os problemas”.

De acordo com a ministra Ideli Salvatti, o objetivo do programa é fazer com que o Governo Federal arque com os custos da mão de obra, o que vai contribuir para que os municípios diminuam os custos com os profissionais. “Sabemos que há prefeitos oferecendo até R$ 30 mil para os médicos, e há os que se negam a passar a semana nos municípios. Isso vai acabar”, garantiu.

Apesar da intenção do Governo Federal, a aprovação ainda precisa da aprovação do Congresso Nacional. Por isso, durante o encontro, a ministra pediu o auxílio do presidente da Câmara dos Deputados, Henrique Eduardo Alves, para a aprovação da matéria. “Sabemos que não será fácil aprovar isso no Congresso, porque a categoria não quer. Teremos um debate muito difícil de ser feito, mas estamos confiantes”, disse Ideli Salvatti.

O presidente do Conselho Regional de Medicina do Rio Grande do Norte (Cremern), Jeancarlo Cavalcante, também se manifestou contrário a vinda de médicos estrangeiros. Segundo ele, a falta de interesses dos médicos em trabalharem no interior do país é multifatorial, como condições de trabalho, falta de estabilidade e o valor do salário.

Jeancarlo Cavalcante acredita que a existência de um Plano de Cargos proposto pelo Governo “amenizaria ou acabaria com a falta de médicos no interior”. Além disso, o presidente do Conselho Regional de Medicina explica que, para exercer a Medicina no Brasil, os médicos precisam reconhecer e validar o diploma. “Os médicos que virão para o Brasil são de qualidade duvidosa, sem filtro, e virão de Cuba, Venezuela”, afirma Jeancarlo.

Geraldo Ferreira também analisou o processo de admissão dos médicos estrangeiros. Segundo ele, a revalidação do diploma de estrangeiro é um tema polêmico, devido ao alto índice de reprovação e suspeitas de irregularidades nas aplicações das provas, sendo inclusive objeto de investigação da Polícia Federal. Por lei, médico formado em qualquer faculdade estrangeira deve revalidar seu diploma por uma instituição de ensino para poder atuar no Brasil. A regra existe como forma de assegurar que o candidato tenha cursado as disciplinas mínimas que o Estado brasileiro considera necessárias ao exercício da função. No entanto, o índice de reprovação é alto. No ano passado, dos 677 candidatos inscritos no processo para revalidação do diploma, só 65 passaram. Outro ponto observado por Geraldo Ferreira é se houve seu treinamento com carga horária compatível.

“Os médicos estrangeiros têm que fazer a prova de equivalência para verificar se a qualidade de ensino no exterior é compatível com a do Brasil. O alto índice de reprovação nessa prova mostra a baixa qualidade desses profissionais. Daí, o Governo coloca esses profissionais, com a falta de medicamentos e a infraestrutura precária, o que pode resultar em colocar em risco a vida das pessoas. Por outro lado, aqueles médicos que estão preparados não vão agüentar trabalhar por muito tempo no interior. O Governo não quer fazer o dever de casa, que seria a implantação de um Plano de Cargos e Salários, criando uma carreira médica, piso salarial adequado, além de dar condições dignas de trabalho”, destacou o presidente da Federação Nacional dos Médicos.

Medidas

O Brasil tem hoje mais de 370 mil médicos registrados nos conselhos de Medicina, o que representa uma média de quase dois profissionais para cada grupo de mil habitantes, de acordo com a Organização Mundial da Saúde. É menos do que na Argentina, no Uruguai e em Cuba, por exemplo. Para o Governo Federal, a carência de profissionais precisa ser solucionada o quanto antes. Por isso, algumas medidas estão sendo analisadas.

O Governo Federal quer estimular a formação de novos médicos e pretende incentivar a criação de mais vagas em universidades que tenham cursos de Medicina bem avaliados pelo MEC. Por outro lado, se discute o afrouxamento das exigências para um médico formado no exterior trabalhar no Brasil.

Entre as medidas em estudo pelo Governo, está a possibilidade de oferecer um estágio de até dois anos para os médicos vindos de fora. O curso seria pago pelo poder público, e o profissional trabalharia na rede do SUS e no Programa de Saúde da Família. Ao fim do estágio, o médico teria o diploma automaticamente validado no Brasil.

whatsapp button