O infectologista e pesquisador da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), Kleber Luz, não acompanhou a senhora que morreu, supostamente, acometida por febre amarela urbana em agosto passado. A mulher, que não teve a identidade revelada, ficou internada numa Unidade de Terapia Intensiva (UTI) do Hospital Monsenhor Walfredo Gurgel, em Natal. O especialista recebeu a notícia do caso com desconfiança e fez ressalvas em relação à publicização do caso sem ampla e detalhada investigação técnica. “Particularmente, não analisei o processo todo. Mas, a impressão que tenho é de que o caso não é verídico. A vítima não havia viajado para a Amazônia e nem teve contato com outras pessoas que contraíram a doença”, frisou Kleber Luz.
A notícia de que uma mulher de meia idade havia morrido em decorrência da febre amarela urbana foi confirmada pela diretora do Departamento de Vigilância em Saúde da Secretaria Municipal de Saúde (SMS), Juliana Araújo, quarta-feira passada. A doença, assim como a dengue, zika e chikungunya, também é transmitida pelo mosquito Aedes aegypti. Sem revelar o laboratório que fez o exame que confirmou a doença na vítima, o Departamento de Vigilância em Saúde do Município iniciará uma investigação para saber como ocorreu a contração da moléstia. Os últimos casos de febre amarela foram registrados em Natal há quase um século, na década de 1920, enquanto a capital ainda era uma, basicamente, um vila.
O infectologista Kleber Luz destacou que é necessário ter cautela num caso complicado como o exposto. “Tem que ter bom senso na avaliação de um caso complexo como este que é para não amedrontar a população, que já está assustada com as demais doenças transmitidas pelo mosquito Aedes aegypti”, destacou. O especialista apontou que, conforme previamente analisado e com base em informações repassadas por outros profissionais da Saúde que acompanharam o problema, as manifestações clínicas da paciente morta não são compatíveis com quem é infectado pela febre amarela urbana. Além disso, Kleber Luz destacou que outros casos deveriam ter ocorrido. “Se fosse transmissão de febre amarela urbana, outros casos de infecção deveriam ter ocorrido. Não seria um único, isolado”.
Conforme apontado pelo infectologista, a paciente deveria ter sido acompanhada por médicos especialistas com atuação no Hospital Giselda Trigueiro, referência no tratamento e pesquisa de doenças infectocontagiosas no Rio Grande do Norte. Kleber Luz relatou que, de acordo com informações que lhe foram repassadas por outros profissionais da área, com base no prontuário da vítima, esta não apresentava características de quem é acometido pela febre amarela, tais como: olhos amarelos, fígado destruído pela doença e ocorrência de vômito com sangue. “A febre amarela é gravíssima, é assustadora. Por isso que é preciso tanta cautela na publicidade dessa informação. Precisamos avaliar detalhadamente”, disse.
Todo o prontuário médico da mulher que morreu no Hospital Monsenhor Walfredo Gurgel em agosto passado deverá ser encaminhado para o infectologista e pesquisador Kleber Luz. Ele deverá investigar o caso com critério e discutir com outros pesquisadores os sintomas e o passado clínico da mulher morta. “Tem alguma coisa errada com esse diagnóstico. Não se morre de febre amarela no terceiro dia doença, como foi veiculado”, comentou Kleber Luz. Ele explicou que a febre amarela é uma doença gravíssima e que evolui para um quadro irreversível entre o quarto e o quinto dia de infecção, levando o paciente à morte em sete ou oito dias.
Sobre o caso em Natal, ele disse que não lembra de nenhum caso de ocorrência de febre amarela urbana desde que iniciou os estudos na área de Infectologia. Ele destacou que a febre amarela é mais comum em regiões de mata fechada, como a Floresta Amazônica ou em áreas do continente africano com alta infestação do mosquito Aedes aegpyti.
SMS instala gabinete de crise na próxima terça-feira
Dentro da estratégia de combate ao mosquito Aedes Aegypti, a Secretaria Municipal de Saúde (SMS) de Natal deve lançar na próxima terça-feira um gabinete de gestão de crise com representantes da Secretaria Municipal de Meio Ambiente e Urbanismo (Semurb), Secretaria Municipal de Serviços Urbanos (Semsur), Companhia de Serviços Urbanos (Urbana) e Defesa Civil. Conforme Luiz Roberto Fonseca, a reunião do gabinete deve ocorrer todas as quintas-feiras.
O plano nacional de enfrentamento ao mosquito estabelece que em janeiro de 2016 todas as casas brasileiras devem ser visitadas por alguma agente público com a atribuição de combater o Aedes Aegypti. Para o secretário de saúde de Natal, será possível sim bater essa meta na capital potiguar.
“Nós já temos mais de 1.500 pessoas de diferentes instituições. Com a sociedade civil organizada e os parceiros vai ser possível sim passar em todas as casas. Nós vamos ter ônibus para levar esse pessoal, retroescavadeiras”, declarou Fonseca. Além disso, haverá 450 militares das Forças Armadas. Mesmo não organizado em uma determinada entidade, qualquer cidadão pode contribuir para vencer o mosquito com ações me sua própria casa ou em na comunidade. “Não adianta limpar hoje e vir um carroceiro colocar o lixo no mesmo lugar de novo”, destacou.
A partir da próxima semana, o Laboratório Central vai iniciar, em Natal, o exame PCR que vai conseguir diagnosticar o zika vírus. O Rio Grande do Norte já tem 158 casos de microcefalia possivelmente causados por zika vírus, quatro deles são de bebês ainda em gestação. Até agora, dez crianças com microcefalia morreram. Esse é o segundo maior número de mortes entre os Estados brasileiros ao lado da Bahia.