De 3 mil a 20 mil pedindo o impeachment em Natal

De 3 mil a 20 mil pedindo o impeachment em Natal

Natal terá hoje uma marcha contra o governo da presidente Dilma Rousseff a partir das 15h, partindo das imediações do Shopping Midway Mall que percorrerá pouco mais de 1 km pedindo o impeachment num movimento que seus idealizadores dizem ser independente e apartidário, diferente do ocorrido na última sexta-feira quando o Partido dos Trabalhadores (PT), unido a centrais sindicais e movimentos populares saiu às ruas alegando que o ato era em defesa da Petrobras, da democracia, da reforma política e dos direitos trabalhistas.

Os manifestantes de hoje protestarão contra as medidas que estão sendo adotadas pelo governo federal, como os aumentos nos preços da gasolina, energia elétrica, água, além dos cortes nos recursos de programas sociais e educacionais que se somam ao escândalo do desvio de recursos na Petrobrás, apontado pela Operação Lava Jato. A concentração será a partir das 15h no cruzamento das Avenidas Bernardo Vieira e Salgado Filho, em Lagoa Nova. Depois, os manifestantes caminharão por aproximadamente 1,5 km em marcha até a Avenida Miguel Castro, onde acontece a dispersão. De acordo com um dos coordenadores do movimento, Matheus Staufackar, qualquer aproximação com partidos políticos ou mandatários de cargos eletivos está sendo evitada, mas não estão impedidos de participarem como cidadãos. “Utilizaremos carros de som e o microfone estará disponível para quem quiser fazer uso da palavra desde que não sejam políticos e que se inscrevam antes para falar por até 5 minutos”, explica Matheus.

Esse movimento está ligado ao movimento “Brasil Livre”, que eclodiu no país após a disputa eleição presidencial do ano passado, vencida pela presidente Dilma Rousseff no segundo turno, com uma vantagem de 1,68% dos votos. Agora, o movimento pede a retirada da presidente da república do poder. “Nós queremos o impeachment. Esse é o objetivo. Sabemos que é um processo político e que não acontece assim de forma tão simples, mas, indo às ruas, demonstramos que estamos insatisfeitos com a atual situação, com as medidas tomadas e que acreditamos na culpa da candidata que venceu as últimas eleições pela corrupção na Petrobrás”, diz o coordenador Matheus Staufackar. A manifestação foi divulgada pelas redes sociais e também em entrevistas nos veículos de comunicação. Há uma comunidade no Facebook chamada “Força Democrática”, com mais de 300 membros. Os coordenadores falam que o movimento tem caráter apartidário e por isso evitam ligações com agremiações políticas.

Segundo o coordenador, o movimento já foi procurado por representantes de siglas partidárias que queriam aliar a imagem do partido ao movimento, mas ele diz que não aceitaram. “Não aceitamos, até porque se fosse outro candidato de outro partido que tivesse ganhado e estivesse agindo da mesma forma, também estaríamos indignados”, justificou.

CRÍTICA
Mesmo tentando preservar sua independência, o movimento foi criticado nas redes sociais como sendo uma manifestação “da elite branca ligada aos partidos de direita”, que é contra as ações sociais da Presidente Dilma Rousseff. “Aí sim, estes sabemos que são pessoas ligadas aos partidos que apoiam a presidente”, disse. E acrescentou: “Tentaram denegrir a imagem do movimento ligando a partidos de oposição à gente, mas somos apenas cidadãos insatisfeitos que tomaram a iniciativa de protestar. A diferença é que estamos chamando para um debate político e ideológico e não para uma guerra partidária ou para a violência”. Grupos querem fundar instituto Unidos pelo Brasil A expectativa inicial era de que mil pessoas comparecessem hoje à Avenida Salgado Filho, mas em um único dia, o movimento conseguiu vender mil camisetas confeccionadas para o protesto e até meados desta semana as vendas já ultrapassavam as 2 mil unidades. Agora, os coordenadores esperam um público que pode variar entre 3 e 20 mil pessoas na marcha.

O Comando da Polícia Militar já garantiu que fará a segurança com efetivo equivalente ao que atendeu ao maior protesto em 2013 que levou ás ruas mais de 30 mil pessoas na capital potiguar, inclusive com policiais a paisana. Além disso, a organização contratou 20 seguranças para prevenir ações de vandalismo. De acordo com Matheus Staufackar a organização do movimento de hoje partiu de grupos que se reúnem independentemente em Natal para discutir política e administração pública. Esses grupos reúnem profissionais como médicos, advogados, empresários, estudantes universitários, entre outros, desde o ano passado com o objetivo de compreender o que dizem os políticos e qual é a real situação do país e do estado.

O que Matheus participa chama-se “Força Democrática”, mas ele diz que existem outros com a mesma dinâmica. “São grupos plurais e heterogêneos que se reúnem em locais cedidos e convidam pessoas que entendam do assunto para esclarecer dúvidas e dados divulgados pelo governo”, explica. A ideia é entender o que acontece para ter embasamento e formar opinião verdadeira sobre a real situação apresentada. Os grupos são independentes entre si, mas têm a intenção de fundar o “Instituto Unidos Pelo Brasil”, para ampliar as discussões, expandir essa cultura de debater as ideias política e ideológicas e cobrar aos detentores de mandatos medidas para resolver os problemas, por meio de uma instituição jurídica.

Foi dessa forma que, segundo Matheus, o grupo compreendeu que a presidente Dilma Rousseff mentiu em campanha, visto que ao ser empossada para o segundo mandato tomou medidas diferentes das que disse que faria, mesmo tendo conhecimento prévio durante a campanha sobre a situação do país. “O mínimo que se esperava é que fosse coerente e a candidata que ganhou não está sendo. Só esse fato já é um agravante”, argumenta.

Sinmed participa, mas não pede saída de Dilma

A única entidade de classe que confirmou participação e vem se organizando há semanas para o protesto de hoje é o Sindicato dos Médicos do Rio Grande do Norte (Sinmed/RN) que já vinha se mobilizando antes mesmo das eleições passadas contra o governo Dilma e a gestão da saúde pública. O Sinmed segue orientação da Federação Nacional dos Médicos (Fenam) que reuniu os dirigentes dos Sinmed’s dos estados nesta semana para detalhar as ações de hoje, contudo, o enfoque não é o pedido de impeachment. “Nos reunimos com todos os sindicatos médicos do Brasil e produzimos um documento conclamando os médicos brasileiros a participarem das manifestações que são de toda a sociedade em defesa da sáude. Vamos sair em defesa do sistema de saúde dos brasileiros com o lema: ‘A corrupção faz mal a saúde’”, explica o presidente do Sinmed/RN, Geraldo Ferreira.

São esperados cerca de 500 médicos que estarão acompanhados de familiares para se juntar aos outros manifestantes nas proximidades do Shopping Midway. O movimento dos médicos se concentrará na Associação Médica, na Avenida Hermes da Fonseca, às 14h30min e seguem às 15h30min para encontrar o movimento maior. Contudo, os médicos não pedem o impeachment da presidente. “Não tratamos do impeachment, Eu acho que deve se abrir processo para apurar a culpa da presidente e, se concluir a culpa, aí sim pedir impeachment. Nós defendemos a abertura do processo e não o impeachment já de imediato”, argumenta o presidente.

Os médicos confeccionaram faixas e camisetas para participar da caminhada de hoje e caracterizam sua participação como sendo a continuidade das ações que já vêm executando contra o governo da presidente Dilma Rousseff, a quem responsabilizam pela deficiência e falta de investimento na saúde pública.

Cientistas falam em cautela antes de pedir impeachment

Ouvidos pelo NOVO Jornal, especialistas das ciências políticas e sociais dizem que as movimentações de hoje em Natal e em todo o país podem estar sendo precipitadas no tocante ao pedido de impeachment e que as ligações político-partidárias, que podem estar por trás desses movimentos, podem levar o país a uma instabilidade política, fruto da acirrada disputa eleitoral do ano passado.

O cientista político e professor da Universidade Federal do estado (UFRN), Antonio Spinelli, observa que o caráter das manifestações de hoje são de oposição e que o contexto atual é diferente da era Collor, quando o então presidente Fernando Collor de Mello foi deposto do cargo, sob acusações de ter sido diretamente beneficiado em um esquema de corrupção. “As manifestações programadas para este domingo são claramente de oposição e no momento em que se levanta a questão do impeachment, que muito embora esteja previsto em lei, precisa de um fato concreto. Collor teve relação direta e foi beneficiado em um esquema de corrupção, no caso de Dilma o que há são suposições”, explica. Para o professor, ainda se busca fatos para justificar o pedido de impeachment que será ecoado nas ruas hoje. Ele também correlaciona as manifestações a uma possível insatisfação pela derrota eleitoral do grupo da oposição. “É como se não tivesse havido uma vitória legítima, mas houve. É uma atitude golpista contra a democracia. A proposta de impeachment abre espaço para soluções autoritárias”, diz Spinelli.

A cientista social e coordenadora do curso de gestão pública da Universidade Potiguar (UnP), Maria Tânia Nagaki, também compartilha da mesma análise. Ela diz ainda que alguns grupos que saem para protestar ainda não conseguem fundamentar suas reivindicações, como ocorreu em 2013. “Naqueles movimentos eram pessoas usando da baderna como forma de querer justificar e querer mudanças. Perderam até o sentido dessas mudanças. Hoje o que acontece é que as questões econômicas que surgiram a partir dos escândalos de corrupção vêm fazer com que as pessoas mostrem o desagrado, inclusive por promessas feitas em campanha e que o oposto está sendo executado”, diz a professora. Ela questiona se há grupos políticos se beneficiando da iniciativa de pessoas que não se dão conta de que estão contribuindo para provocar uma instabilidade político-administrativa com uma tentativa de impeachment que, por enquanto, diz, não se justifica. “Será que não está beneficiando grupos para desestabilizar o país? Tem sentido? É fácil pedir impeachment quando a sociedade ainda não conhece o significado disso. Para as mudanças ocorrerem os movimentos precisam ter sustentabilidade e motivação e estes perdem a força quando não se sustentam”, conclui Tania Nagaski.

José Agripino e Rógério Marinho defendem direito à manifestação Apesar dos organizadores garantirem que não existe nenhuma ligação entre o movimento e as siglas partidárias, alguns representantes políticos da oposição no estado podem aparecer e até mesmo caminhar junto aos manifestantes. O deputado federal, Rogério Marinho (PSDB), de extrema oposição ao governo Dilma Rousseff, anunciou que estará presente na condição de cidadão e que levará junto a sua família para pedir o impeachment da presidente. “O país passa por uma crise ética, moral e econômica e a população não quer ser omissa e nem emudecer. Esses protestos são uma demonstração do descontentamento com o governo e como cidadão estarei presente”, diz o deputado.

Já o senador José Agripino, um dos grandes nomes da oposição a Dilma no congresso nacional, disse que apoia o movimento, mas não comparecerá nem ao de Natal e nem a qualquer outro no país. “Considero as manifestações legítimas e parte importante da Democracia brasileira, mas não irei participar não. Julgo essas manifestações apartidárias, espontâneas e vindas da vontade popular”, disse o senador, presidente nacional dos Democratas. Nesta semana, o partido publicou uma nota oficial de apoio às manifestações contra Dilma, assinada pelo líder próprio José Agripino; Líder do partido no Senado, senador Ronaldo Caiado (GO); líder na Câmara Federal, deputado Mendonça Filho (PE); e pelo líder da minoria no Congresso, deputado Pauderney Avelino (AM). A nota dizia que os movimentos de protestos são legítimos, dignos pelo caráter pacífico e, portanto, merecedores do respeito dos Democratas.

“Entendemos que estes movimentos apartidários devem ser compreendidos como manifestações refletidas da sociedade organizada e, portanto, merecedoras da importância e do respeito que os simpatizantes do Democratas têm pelos seus organizadores”, explicava a nota.

Enquanto isso, os petistas que organizaram o movimento da última sexta-feira com o argumento de defender e apoiar a Petrobrás e a Democracia, criticaram o movimento de hoje, apesar de reconhecer que era um direito dos cidadãos sair as ruas e expressar opinião, mas acreditam que existem grupos políticos de oposição por trás do movimento. “É válida porque todo cidadão tem direito de protestar, mas não é um movimento apartidário. É uma manifestação convocada por quem perdeu as eleições, não se contenta e busca criar um clima de instabilidade no país”, disse o deputado Fernando Mineiro (PT), um dos organizadores do movimento da última sexta-feira.

 

Publicado em: Novo Jornal Online

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