25/08/2021
25/08/2021
O desejo das pessoas de consumir substâncias que alteram seu estado de consciência é tão antigo quanto a sociedade, como são antigas as tentativas de regulamentar seu consumo, diz Theodore Dalrymple. Prazer e felicidade são sensações orgânicas, fisiológicas, que tornam um ato agradável, com vistas a suprir uma carência biológica essencial à sobrevivência, como beber água, alimentar-se, reproduzir-se. Há mecanismos biológicos que buscam a liberdade de continuar vivo, e um mais recente que busca a liberdade como reivindicação de felicidade e diversão. Às vezes sem qualquer controle ou limite, a ponto do psiquiatra Pier Vicenzo Piazza anotar “deixamos de sobreviver graças ao prazer e à felicidade e começamos a viver para obtê-los”, e isso de forma tão forte que pode ameaçar nossa própria vida, como jogos radicais, hiperalimentação ou uso de drogas. Para avaliar se um excesso transformou-se em doença, três critério importam: causa razoável, frequência e invasão. A resposta desproporcional a situação que a originou, a frequência do comportamento com ou sem presença da razão provável e a interferência entre o modo de agir e o restante da vida da pessoa apontam para problemas. As dependências são doenças do cérebro, e embora alguns especialistas nas ciências humanas teimem em afirmar o contrário, Vicenzo nos diz que “a denominada dependência psicológica é 100% biológica.” Substâncias são consideradas drogas quando desencadeiam efeitos agradáveis que estimulam o consumo, efeitos nefastos que deveriam nos afastar delas e dependência que tiram a liberdade do indivíduo de consumi-la ou não. Há drogas que substituem os neurotransmissores e drogas que intensificam seu efeito. Os neurotransmissores naturais são regulados pelo cérebro para respostas precisas, limitadas no tempo e na intensidade, isso não ocorre com as drogas, sendo sua ação desproporcional a causa de seus efeitos tóxicos. As drogas alteram o comportamento, afetando a cognição, motivação e motricidade, diminuindo seu desempenho e capacidade de funcionar, desajustam a capacidade de julgamento, levando à exposição a riscos e comportamentos negativos, com repercussões médicas, judiciais e sociais, e desencadeiam sintomas psiquiátricos como ansiedade, alucinações, surtos maníacos e paranoicos. Quando se discute a possibilidade de descriminalização do uso das drogas se fala em liberdade, um argumento irracional, já que por mecanismos biológicos as drogas levam a uma escravização do organismo. Fica uma questão a ser vista, porque algumas drogas são legais e outras não. Vicenzo questiona se a liberação se daria por razões históricas de costume social, toxicidade menor para o organismo, capacidade menor de causar dependência ou razões econômicas e os enormes interesses envolvidos, para concluir que “a escolha foi feita com base nos efeitos comportamentais agudos das drogas e sua capacidade de manutenção da utilidade social do indivíduo”, assim parece que o princípio organizador da proibição é a interação entre efeitos sobre o comportamento e adequação social. A verdade é que, como diz Dalrymple, consumir drogas não é um divertimento inocente, “prejudica a habilidade de construir uma vida profissional e promove o parasitismo, prejudica a busca de objetivos humanos e cumprir obrigações públicas.” O uso de drogas limita a habilidade das pessoas de ganhar a própria vida, mina a capacidade de planos de longo prazo e, sendo o foco do dependente, ele não hesitará de, para obtê-la, recorrer a ações criminosas. Os que pensam que a legalização das drogas diminuiria a criminalidade e a violência envolvidas no tráfico, preferem ignorar a economia do crime que, como diz Manuel Castells, movimenta trilhões no mundo e tem as organizações criminosas associadas no tráfico de drogas, de armas, material nuclear, contrabando ilegal de imigrantes, de mulheres e crianças, de órgãos, até chegar à lavagem do dinheiro, onde os lucros são legalizados, e o poder granjeado as instiga a competirem com os Estados-nações.
Dr. Geraldo Ferreira – Médico e Presidente do Sinmed RN