10/03/2022
10/03/2022
Ao longo dos últimos duzentos anos, o Ocidente tomou a dianteira dos avanços econômicos, culturais e tecnológicos no mundo. Também estabeleceu as condutas centrais nas esferas de negócios e política, combinando democracia e economia de mercado. A transição da era industrial para a era da informação foi feita por duas tecnologias disruptivas que se originaram na segunda metade do século XX, o computador e a internet. A digitalização tem sido a força revolucionária que atravessa a maioria das indústrias e organizações, e a globalização com as interconexões e inter-relações, propiciadas pela digitalização, tem fomentado as mudanças no mercado de trabalho, na educação, consumo, além das necessidades crescentes do ser humano nas áreas de lazer, saúde, esportes, música, arte, espiritualidade, meio-ambiente. O somatório do aumento da tecnologia e das interações evocam respostas que podem surgir como desafios ou oportunidades. Compreender as tendências em períodos de transição é fundamental, “informação correta e completa é a chave. Ao coletar fatos e informações, a mídia de qualidade é essencial”, escrevem Doris e John Naisbitt, em Dominando as megatendências. Os programas de inteligência artificial e reconhecimento óptico de caracteres não deixarão intocadas qualquer profissão, o terreno para a superinteligência artificial já está sendo preparado e deve ser realidade por volta de 2060. A big data, os algoritmos servem de apoio, mas já geram por si próprios decisões. A internet foi a força mais poderosa a promover a transição da era industrial para a era da informação. O infoentretenimento alimenta torrencialmente uma demanda aparentemente ilimitada, que compete no mesmo nível com a necessidade crescente de comunicação pessoal e aperfeiçoamento da informação. Tudo isso repercute sobre a cultura, com consequências para a sociedade. A aparentemente infindável rede de relacionamentos contrasta com a cultura do Individualismo, ou segmentação em comunidades virtuais, que podem se distanciar, isoladas em seus pressupostos, tornando-se intolerante e confrontando pensamentos diferentes. “Culturas são formadas por processos de comunicação”, escreve Manuel Castells em A Sociedade em Rede, a rede digitalizada com a inclusão e abrangência de todas as expressões culturais enfraqueceram o poder simbólico dos emissores tradicionais fora do sistema, religião, moralidade, autoridade, valores tradicionais, poder político. A virtualidade real, totalmente imersa em uma composição de imagens de um mundo de faz de conta, gera uma cultura que transcende o sistema de representação vivido historicamente, é a cultura da virtualidade, “onde o faz-de-conta vai se tornando realidade”, registra Castells. O fascínio das mídias on-line, além do seu imediatismo, é a bolha onde as pessoas se colocam e transitam, e suas opiniões, ideologias, visão de mundo, ideias e crenças são amplificadas e fortalecidas. A consciência é ainda hoje território dos seres humanos, mas a consciência do real é tomada das informações colhidas, e isso pode ser manipulado. O bot, diminutivo de robot, é uma aplicação de software, concebida para simular ações humanas repetidas no mesmo padrão. O uso de bots é particularmente nocivo quando empregado como máquina de propaganda para influenciar a opinião pública, construir ou destruir reputações, e desestabilizar o mercado ou a política. O Twitter reconhece que 14% de sua base de usuários é de robôs. As lentes que usamos para reunir as informações são essenciais para nossos juízos e decisões. As mídias têm o poder de condicionar a população, construindo o real visível ou o virtual real. A Internet trouxe a humanidade a um novo estágio da cultura, onde surge um modelo de interação e organização social, predominantemente mediado pelas redes de comunicação, onde a prática política é crescente, a liderança é individualizada e personalizada, e a formação de imagem é geração de poder. No espelho da realidade, o ser humano pode estranhar a imagem refletida, sugere Manuel Castells.
Dr. Geraldo Ferreira – Médico e Presidente do Sinmed RN
Artigo publicado no Agora Jornal dia 10 de março de 2022.